[ Rosana Palazyan - 4ª Bienal de Arte Contemporânea de Thessaloniki - Grécia ]

abertura: 18/09/2013
até 31/01/2014



“... Uma história que nunca mais esqueci...” é uma videoinstalação cujo vídeo produzido de forma ‘artesanal’ não tem pretensões de virtuosismos técnicos, mas de reordenar ou ornazinar a memória fragmentada sobre o genocídio armênio (c. 1915 a 1920) com base nas histórias e relatos ouvidos ao longo da vida desde a infância. Uma história que sempre foi impossível esquecer, pois o esquecimento seria o esquecimento do próprio ser.

Brasileira de ascendência Armênia de ambos os lados, tendo iniciado minha carreira no final dos anos 80 e cercada por episódios de violência, traumas sociais, econômicos e políticos em meu país, não me sentia a vontade para tratar do tema “Armênia”. Minha urgência era aproximar as pessoas adormecidas pela banalização do cotidiano às questões que nos eram mais próximas. Desde então, venho buscando delicadamente ampliar, e potencializar a reflexão sobre a violência e exclusão no tecido social, onde todos acabam vitimados.


Ao ser convidada para participar da 4ª Bienal de Thessaloniki, cidade onde meus antepassados e seus amigos sobreviventes se refugiaram durantes alguns anos, o passado tão distante, estava diante de mim, tão próximo...

E “quem se lembra do genocídio armênio?” Eu lembro.

Foi preciso remontar cada fragmento da memória como em um quebra cabeças, carregado de enorme custo pessoal, para recontar mais uma vez uma história que me foi contada e que nunca esqueci. Lembrar e fazer lembrar para nunca mais acontecer.

O fio condutor da história é um lenço bordado por minha avó materna, quando refugiada na Armenian General Benevolente Union em Thessaloniki (Grécia) onde muito jovem foi professora de bordado. O lenço transformado a cada episódio, perpassa sua história desde as memórias de infância, a vida na Grécia como refugiada, a viagem ao Rio de janeiro por volta de 1926 - até que o lenço retorne como parte integrante da obra a ser apresentada na bienal em 2013.



Escrevo este texto no calor dos acontecimentos quando nos últimos dias em meu país, jovens, mulheres, crianças, famílias, estão nas ruas lutando por seus direitos, vivendo momentos que não vivenciamos há muitos anos. O que tem me feito pensar na proximidade de todos os projetos e experiências que arte tem me possibilitado realizar.

Se não muda o mundo, tenho vivido a arte como um percurso do entendimento e encontro como o Outro. E de forma incansável tenho me dedicado a transformar as relações das pessoas frente a questões tão urgentes, na tentativa de fazer acionar a mobilização para um mundo melhor.

Rosana Palazyan, Junho de 2013

[ Fábio Carvalho - Residência Artística ID POOL - Porcelana Vista Alegre ]

O artista Fábio Carvalho participou de outubro a dezembro de 2013 da residência artística ID POOL na Fábrica de Porcelana Vista Alegre. Esta foi a sua quarta residência artística naquele país, e a segunda na Vista Alegre, onde já havia participado em 2011 da residência “Projecto Artistas Contemporâneos”.

Durante a atual residência, além de desenvolver seu trabalho autoral, incorporando elementos e materiais da fábrica na minha pesquisa corrente de trabalho, como por exemplo a série “V.A.”, Fábio Carvalho produziu duas séries de imagens que serão incorporadas às peças da Porcelana Vista Alegre.

Nos desenhos da série “V.A.” foram usadas folhas de prova de impressão do setor de produção de decalques da Porcelana Vista Alegre, decalques estes que são usados na decoração das peças de porcelana. Estas folhas são usadas repetidas vezes de forma aleatória, e com a superposição das várias provas de impressão, vão sendo criados novos e intricados padrões. Em meio aos resultados das impressões, o artista redesenhou elementos do universo masculino obtidos de manuais de fisioculturismo antigos, desde a década de 1930 até a década de 1950.

V.A. (um bongo 3)
naquim e acrílica sobre serigrafia em papel de prova
de impressão para produção de decalque
2013 | 29,7 x 21 cm

Fábio Carvalho também criou peças originais para comercialização pela Porcelana Vista Alegre, peças estas que apresentam aspectos de seu vocabulário artístico pessoal. A decoração de porcelana foi o primeiro elemento do universo aceito como feminino que o artista usou em seus trabalhos da série Macho Toys, em contraposição aos estereótipos de masculinidade e virilidade.

Durante a residência na Porcelana Vista Alegre Fábio Carvalho procurou conciliar sua produção autoral com o imaginário tradicional da fábrica, para criar peças de intensa beleza, mas ainda assim manter a dialética da sua produção em arte.


Aplicação dos decalques criados pelo artista
em peças da Porcelana Vista Alegre

Ao invés de usar armas de fogo, soldados contemporâneos, entre outras imagens comumente encontradas em sua obra, Fábio fui buscar no passado remoto imagens de guerreiros e suas armas, uma vez que o uso de imagens antigas, de séculos passados, é uma prática recorrente na Porcelana Vista Alegre.



Como disse o artista "é curioso notar como pela distância no tempo estas imagens não são mais percebidas de forma geral como brutais e ameaçadoras, embora em essência o sejam, e destinavam-se a ser assim, mas muito pelo contrário, são vistas como imagens nostálgicas de um tempo de maior heroísmo e honradez que o atual".

Na residência artística Fábio Carvalho criou duas séries de trabalhos: Armi dell'Arte e Turnierbuch.


As imagens usadas no projeto Armi dell'Arte são xilogravuras que ilustram o livro “Opera Nova dell'Arte delle Armi”, de autoria do italiano Achille Marozzo (1484-1553), publicado em 1536 em Modena, e atualmente no acervo da Biblioteca Estadual da Baviera, Alemanha, que gentilmente deu permissão para o uso das imagens. Este livro é considerado uma das obras mais importantes sobre esgrima e os rituais dos duelos judiciais na Itália no século XVI, e atualmente o trabalho de Marozzo vem sendo estudado por vários grupos de Esgrima Histórica em diversos países.


Sobre as imagens dos lutadores de esgrima, o artista aplicou uma exagerada quantidade de padrões decorativos antigos do período vitoriano, principalmente florais, mas também insetos e aves, que eram comumente usados pelas mulheres em seus "scrapbooks", junto com fotos de família, cartões postais, etc.


Já as imagens usadas no projeto Turnierbuch são ilustrações pintadas à mão do livro “Turnierbuch - Kopie nach dem Original von Hans Burgkmair”, de autoria de Hans Burgkmair, publicado por volta de 1540, e criado como uma forma de propaganda em tributo aos triunfos do Imperador Maximiliano I. Este livro também se encontra no acervo da Biblioteca Estadual da Baviera, que igualmente deu permissão para o uso das imagens. A procissão imaginária retratada nas ilustrações representa as aspirações, realizações e interesses do Imperador. São apresentados os membros do corte: caçadores, funcionários judiciais, músicos, palhaços, mascarados e homens de que simbolizam os diferentes tipos de torneios.


Para o projeto, o artista selecionou algumas imagens de cavaleiros e soldados. Às imagens dos cavaleiros e soldados, aplicou ilustrações antigas (período vitoriano) de diversos pássaros. A ideia de usar os pássaros, segundo o artista, partiu do fato de já haver nas ilustrações um curioso uso de aves (entre outros símbolos) como elementos alegóricos.